1 -
Conceito e Visão de Outras Doutrinas Espiritualistas
Reencarnar quer dizer encarnar outra vez, ou
seja, tomar de novo um corpo de carne.
Só pode aceitar a reencarnação quem aceita a
existência do Espírito e a vida futura, porque aquele que duvida de uma destas
duas afirmativas, não pode jamais aceitar a volta do Espírito a um outro corpo
de carne. Logo para tratarmos deste assunto, pressuporemos que todos com quem
estamos tratando, sejam defensores destas duas idéias.
Usa-se também o termo palingenesia para
designar tal fato. Esta palavra é etimologicamente originária do grego: palin =
de novo, e gênesis = geração; ou seja, nascer de novo.
A reencarnação é assunto tão antigo, que
vários povos já a tinham como realidade, não só nos setores religiosos, mas
também nos da Filosofia.
Podemos seguramente afirmar que a história da
reencarnação se confunde com a própria história da evolução do pensamento
religioso.
“Na
Índia, desde remotíssima antigüidade, de que nos dão notícias os Vedas e o
Bhagavad-Gitâ, o conhecimento da reencarnação era sobejamente divulgado através
dos cantos imortais da formação moral e cultural do homem.” [1]
O Bramanismo e o Budismo nela se inspiraram.
Encontramos no Mazdeismo, antiga religião
Persa, o Espírito encontrando a bem aventurança final, não sem ter antes
passado por uma purificação progressiva através de provas expiatórias.
No Egito, a doutrina das transmigrações
também era conhecida. Ao nascer, o egípcio era representado por duas figuras,
uma era a sua personalidade e a outra seu duplo. Durante a vigília, as duas se
confundem, mas durante o sono, ao passo que uma descansa, a outra se lança no
mundo dos sonhos.
Na cultura grega, foi Pitágoras quem a
introduziu após suas viagens realizadas junto aos egípcios e persas. Vamos
encontrá-la ainda nos poemas órficos, em Sócrates, Platão, Empédocles etc.. Ela
é afirmada com clareza no último livro da “República”, em “Fedra”, em “Timeu” e
em “Fédon”.
“É
certo que os vivos nascem dos mortos e que as almas dos mortos tornam a nascer”
(Fedra).
“Alma é mais velha que o corpo. As almas
renascem incessantemente do Hades para tornarem à vida atual.” (Fédon)
Sófocles como Aristófones também adotaram a
mesma crença.
Virgílio, Ovídio e Cícero, pensadores
romanos, infiltraram-na em suas lições. Virgílio, na “Eneida”, assevera que a
alma, mergulhando no Letes, perde a lembrança das suas existências passadas.
Os druídas apoiavam toda a sua filosofia na
justiça palingenésica.
A reencarnação fazia parte dos dogmas dos
judeus, sob o nome de ressurreição. A Bíblia dá reiteradas confirmações disto.
Somente os Saduceus, que eram os materialistas da época, não criam nela. Mas as
idéias dos judeus sob este ponto não eram muito claras. Acreditavam eles que o
homem que vivera, podia renascer, mas não sabiam precisar como.
Os primeiros padres da Igreja, como Orígenes
e S. Clemente de Alexandria, eram adeptos da idéia reencarnacionista. S.
Gregório de Nysse chega a afirmar que há necessidade natural para a alma
imortal de ser curada e purificada e que, se ela não o foi em sua vida
terrestre, a cura se opera pelas vidas futuras e subsequentes. Todavia, a
Igreja não podia conciliar seus dogmas e artigos de fé, armas imprescindíveis
que eram para o poder desta instituição, com a justiça da doutrina
reencarnacionista.
Assim sendo, no Concílio de Constantinopla em
553, os maiorais da Igreja tiraram definitivamente a idéia da reencarnação,
toda aceita entre os primeiros Cristãos, de seu corpo doutrinário.
Com isto, o que a Igreja fez foi afastar
ainda mais os homens de bom senso, do Criador, porque ao invés de uma doutrina
simples e clara a respeito da imortalidade da alma e da vida futura, edificou
todo um complexo conjunto de dogmas, lançando o homem na obscuridade e no
completo desconhecimento de seu destino.
Desta forma, a reencarnação desaparece
temporariamente das cogitações filosóficas ocidentais, ainda que alguns pensadores
medievais tenham tido o atrevimento de entregar-se aos estudos destes
conceitos. O que lhes valeram pela intolerância e ignorância religiosa, muitas
vezes, a perda da própria vida.
Apesar da idéia reencarnacionista, como
vimos, ser de todos os tempos, foi só nos meados do século XIX, com a
Codificação Espírita, que tal doutrina recebeu uma explicação lógica e um
inegável bom senso. A partir dos estudos dos pioneiros do Espiritismo, pudemos
entender melhor sua fundamentação, sua justiça, seu mecanismo, e a comprovação
bíblica deste misericordioso artigo da Grande Lei.
2 -
Justiça da Reencarnação
Em
que se fundamenta?
Segundo os Espíritos codificadores, na
resposta da questão 171 de O Livro dos Espíritos, a doutrina reencarnacionista
se fundamenta na própria Justiça Divina.
Na análise do conteúdo desta resposta,
verificamos que se não fosse a oportunidade reencarnatória, Deus estaria
privado de um de seus atributos: a justiça, e consequentemente já não seria
Deus.
Para facilitar o nosso raciocínio, citamos a
seguir um texto em que
Kardec disserta sobre a lógica da pluralidade das
existências:
“Se
não há reencarnação, só há, evidentemente, uma existência corporal. Se a nossa
atual existência corpórea é única, a alma de cada homem foi criada por ocasião
do seu nascimento, a menos que se admita a anterioridade da alma, caso em que
caberia perguntar o que era ela antes do nascimento, e se o estado em que se
achava não constituía uma existência sob forma qualquer. Não há meio termo: ou
a alma existia, ou não existia antes do corpo. Se existia, qual a sua situação?
Tinha ou não consciência de si mesma? Se não o tinha, é quase como se não
existisse. Se tinha individualidade, era progressiva ou estacionária? Num e
noutro caso, a que grau chegara ao tomar o corpo? Admitindo, de acordo com a
crença vulgar, que a alma nasce com o corpo, ou, o que vem a ser o mesmo, que
antes de encarnar, só dispõe de faculdades negativas perguntamos:
1o
Porque mostra a alma aptidões tão diversas e independentes das idéias que a educação
lhe fez adquirir?
2o
Donde vem a aptidão extra normal que muitas crianças em tenra idade revelam,
para esta ou aquela arte, para esta ou aquela ciência, enquanto outras se
conservam inferiores ou medíocres durante a vida toda?
3o
Donde, em uns, as idéias inatas ou intuitivas, que noutros não existem?
4o
Donde em certas crianças, o instinto precoce que revelam para os vícios ou para
as virtudes, os sentimentos inatos de dignidade ou baixeza, contrastando com o
meio em que elas nasceram?
5o
Por que abstraindo-se da educação, uns homens são mais adiantados do que
outros?
6o
Por que há selvagens e homens civilizados? Se tomardes de um menino hotentote
recém-nascido e o educardes nos nossos melhores liceus, fareis dele algum dia
um Laplace ou um Newton? (…)” [2]
Através deste raciocínio kardequiano, vimos
acima de tudo que a reencarnação é fundamentada na justiça divina, e que
assenta na mais perfeita lógica e no maior bom senso.
Provas
da Reencarnação
Mas que provas podemos ter da reencarnação,
além destas explícitas neste raciocínio?
Podemos dividir estas provas em duas
categorias: provas filosóficas e provas experimentais.
Filosóficas
Como entender a justiça divina, sem aceitar o
princípio reencarnatório? Por que nascem uns pobres e outros ricos? Uns
desfrutam da maior saúde, outros lutam a vida toda com várias doenças. Há os
que vivem muitos anos, e os que vivem poucos meses ou dias. E como a justiça
divina irá julgar estes que não tiveram tempo para serem nem bons nem maus.
Irão para o céu ou para o suplício eterno?
Há também a questão do progresso. Por que a
humanidade de hoje é mais adiantada intelectual e cientificamente do que a
passada? Poderão dizer que a sociedade é que faz o homem assim. Mas como
explicar a diferença brutal que existia entre a capacidade de um homem
primitivo e a do homem atual, se ambos fossem criados no instante do
nascimento, e suas conquistas para nada servissem?
Nos dêem explicações melhores para estes e
outros questionamentos e abandonaremos nossas certezas reencarnatórias.
Experimentais
Entre as provas experimentais, podemos citar
a fenomenologia mediúnica com todas as suas nuanças. A comunicação dos
Espíritos por si só prova a imortalidade da alma e, consequentemente, a
possibilidade reencarnatória, mas é o conteúdo destas comunicações que nos
dizem da certeza desta doutrina.
Temos ainda o aspecto relacionado com a
regressão da memória, hoje bastante difundido nos meios cientificistas e não
espíritas. A partir desta possibilidade vemos a incursão do ser em muitos
momentos de suas existências pregressas.
E para finalizar as questões das provas,
podemos ainda falar das lembranças de outras vidas, faculdade bastante rara,
mas que já aconteceu com muitas pessoas.
Sobre este assunto indicamos a leitura do
livro A Reencarnação de Gabriel Delanne, do qual tiramos, para ilustração, a
narrativa abaixo, dentre tantas outras existentes nesta obra:
“Há
cinqüenta anos, duas crianças nasceram em uma aldeia chamada Okshitgon, um
rapaz e uma menina. Vieram ao mundo no mesmo dia, em casas vizinhas, cresceram
juntos, brincaram juntos, amaram-se.
Casaram-se
e fizeram uma família (…)
A
morte os levou no mesmo dia; enterraram-nos fora da aldeia, depois os
esqueceram (…)
Nesse
ano, após a tomada de Mandalay, a Birmânia inteira sublevou-se (…) Tristes
tempos para os homens pacíficos, e muitos, fugindo de suas habitações,
refugiavam-se nos lugares mais habitados (…)
Okshitgon
estava nos centros de um dos distritos mais castigados; grande números de seus
habitantes fugiram, e entre eles um homem chamado Maung Kan e sua jovem mulher.
Eles se estabeleceram em
Kabyn. Tiveram dois filhos gêmeos, nascidos em Okshitgon,
pouco antes de abandonarem o lar. O mais velho chamava-se Maung-Gyi, isto é,
Rapaz Grande. As crianças cresceram em Kabu e começaram logo a falar. Seus pais
notaram com espanto que, durante os brinquedos, chamavam-se, não Maung-Gyi e
Maung-Ngé, mas Maung San Nyein e Ma-Gyroin; este último é nome de mulher; Maung
Kan e a esposa lembraram que assim se chamavam os cônjuges falecidos em
Okshitgon, na época em que as crianças nasceram.
Eles
pensavam, pois, que as almas daqueles defuntos haviam entrado no corpo dos
filhos, e os levaram a Oksitgon, para os experimentar. As crianças conheceram
toda Okshitgon, estradas, e casas e pessoas; chegaram a reconhecer as roupas
que vestiam na vida anterior.
Não
havia dúvidas. Um deles, o mais moço, lembrou-se de ter tomado emprestado duas
rupias a um certo Ma-Thet, sem que seu marido o soubesse, quando era Ma-Gyroin,
e essa dívida não fora saldada. Ma-Thet vivia ainda. Interrogaram-no e ele se
lembrava, com efeito, de haver emprestado esse dinheiro. (…)
(…)
O menino mais velho (…) é um bom burguês, gordo rechonchudo, mas o gêmeo cadete
é menos forte e tem uma curiosa expressão sonhadora. Contaram-me muitas coisas
da vida passada. Disseram que, depois da morte, viveram, algum tempo, sem corpo
nenhum, errando no espaço, ocultando-se nas árvores, e isso por causa dos
pecados; e, alguns meses depois, nasceram gêmeos (…)” [3]
Objetivo
da Reencarnação
Já sabemos que o Espírito reencarna, e que a
reencarnação se fundamenta na Justiça Divina. Mas por que o Espírito reencarna?
Com que fim?
Allan Kardec também perguntou isto aos
Espíritos. Porém, pela sua capacidade didática, fez duas perguntas:
132 - Qual o objetivo da encarnação?
167 – Qual o fim objetivado com a
reencarnação?
A primeira foi assim respondida: “Deus lhes impõe a encarnação com o fim de
fazê-los chegar à perfeição. Para uns é expiação; para outros missão. (…)” [4]
E a segunda, assim: “Expiação, melhoramento progressivo da humanidade. Sem isto, onde a
justiça?” [5]
Analisando o conteúdo destas duas respostas
temos: o objetivo principal da encarnação dos Espíritos, ou da reencarnação, é
a evolução: “Deus lhes impõe a encarnação
com o fim de fazê-los chegar à perfeição”. Acontece que em uma vida só não
dá para cumprir tal objetivo. O que representa sessenta ou oitenta anos para
uma pessoa, em matéria de aprendizado de todas as coisas para que ela chegue à
perfeição?
Assim sendo, reencarnando inúmeras vezes,
quantas forem necessárias, o Espírito atinge o objetivo primordial de sua
existência.
Desta forma, entendemos que expiar não é o
objetivo da reencarnação, mas pode vir a ser se o Espírito não quiser evoluir
pelo caminho natural do bem.
Trocando em miúdos: o Espírito só passa pela
expiação quando quer, ou seja, quando não quer seguir as Leis Divinas.
Como já vimos anteriormente, a evolução
também é uma Lei de Deus; portanto o Espírito tem de evoluir, consciente ou
inconscientemente. Quando ele entende isso e busca esta evolução por conta
própria, ele a faz sem dor. A expiação só entra na história, quando a rebeldia
fala mais alto, quando ele, sabendo qual caminho a seguir, escolhe outro.
Assim, provocando sofrimento em seus semelhantes,
o ser estaciona. Como ele tem de evoluir, passa pelo sofrimento como que para
despertar a centelha divina que existe dentro de si, que o induz ao
aperfeiçoamento.
É aí que entendemos a misericórdia que é a
oportunidade reencarnatória; não é à toa que Emmanuel nos afirma:
“Cada
encarnação é como se fora um atalho nas estradas da ascensão. Por esse motivo,
o ser humano deve amar a sua existência de lutas e amarguras temporárias,
porquanto ela significa uma bênção divina, quase um perdão de Deus.”[6]
3 -
Reencarnação na Bíblia
A reencarnação acha-se claramente expressa
nos textos sagrados. Muitas são as passagens do Velho e Novo Testamento que nos
servem para elucidar tal afirmativa.
Podemos ainda dividi-las em partes que nos
mostrem seu caráter provacional, evolutivo, missionário e, acima de tudo, como
Lei Divina.
A seguir analisamos algumas passagens:
“Os
teus mortos viverão, os teus mortos ressuscitarão; despertai e exultai, os que
habitais no pó, porque o teu orvalho será como o orvalho das ervas, e a terra
lançará de si os mortos.” [7]
Está clara nesta passagem a afirmativa
reencarnatória, e como Lei, muito bem definida.
A crença nos renascimentos era vista entre os
judeus sob o nome de ressurreição. Por isso o Profeta usa este termo, mas no
fundo quer dizer a mesma coisa, ou para ser mais preciso, no seu sentido de
renovação para uma nova vida, logo, a ressurreição é um objetivo da
reencarnação.
Isaías diz que os mortos viverão, isto não
pode ser entendido como viverão após a vida terrena, porque senão ele diria:
ainda vivem. O termo viverão quer dizer tornar a viver; e para completar, e a
terra lançará de si os mortos, nos dá claramente a idéia de voltar ao corpo de
carne.
“E
havia entre os fariseus um homem, chamado Nicodemos, príncipe dos judeus. Este
foi ter de noite com Jesus, e disse-lhe: Rabi, bem sabemos que és Mestre vindo
de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não for
com ele.
Jesus
respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não
nascer de novo, não pode ver o reino de Deus
Disse-lhe
Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho? Porventura pode tornar a
entrar no ventre de sua mãe, e nascer?
Jesus
respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e
do Espírito, não pode entrar no reino de Deus.
O
que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espirito.
Não
te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento assopra
onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabe donde vem, nem para onde vai; assim
é todo aquele que é nascido do Espírito.
Nicodemos
respondeu, e disse-lhe: Como pode ser isso?
Jesus
respondeu, e disse-lhe: Tu és mestre em Israel, e não sabes isto? (…)” [8]
Esta é a passagem clássica em que o texto
evangélico mostra a reencarnação com o objetivo de chegar à perfeição; aquele que não nascer de novo não pode ver o
reino de Deus.
Jesus não podia ser mais claro no sentido de
afirmar a necessidade reencarnatória. E diante da ignorância de Nicodemos, Ele
explica: “nascer da água e do Espírito
(…)”
A água sempre foi tida como o início da vida.
“Na Cabala hebraica, a água era a matéria
primordial; o elemento frutificador.” [9]
Na Gênese mosaica, o autor diz que no
princípio, “o Espírito de Deus se movia
sobre as águas.” [10]
E este ensinamento é também dado por
Emmanuel:
“O
protoplasma foi o embrião de todas as organizações do globo terrestre (…) Os
primeiros habitantes da Terra, no plano material, são as células albuminóides,
as amebas e todas as organizações unicelulares, isoladas e livres, que se
multiplicam prodigiosamente na temperatura tépida dos oceanos.” [11]
“Os modernos conhecimentos científicos atestam
que as primeiras formas de vida, desde a concepção, se fazem no ambiente
aquoso, seja a própria constituição do gameta feminino como o masculino, de
cuja fusão (água) nasce o novo corpo, que adquirindo personalidade diversa da
que possuía antes (espírito), recomeça o cadinho purificador, expungindo males
e sublimando experiências para entrar no reino do Céus.” [12]
Logo, nascer da água, significa reencarnar, e nascer do Espírito, é
renovar, melhorar, evoluir.
E é por isso já ser conhecido dos judeus
daquela época , que Jesus diz: “Tu és
mestre em Israel, e não sabes isto?”
“E
passando Jesus, viu um homem cego de nascença. E os seus discípulos lhe
perguntaram, dizendo: Rabi, quem pecou,
este ou seus pais, para que nascesse cego?
Jesus respondeu: Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim para que se manifestem nele
as obras de Deus.” [13]
Os discípulos de Jesus também já criam na
pluralidade das existências, se assim não fosse, não fariam tal pergunta: “quem
pecou, estes ou seus pais”. Jesus mostra que este não era um caso de pecado
(expiação), mas de missão: “foi assim para que se manifeste nele as obras de
Deus”. Se para Jesus a reencarnação não fosse uma realidade, teria dito aos
seus discípulos claramente ali naquele instante, mas não foi isso que Ele fez,
muito pelo contrário, achou o Mestre naquele instante, oportunidade para nos
ensinar sobre um outro tipo de reencarnação. Trata de uma reencarnação em bases
de cooperação. Quando não temos mais nada a expiar podemos trabalhar como
servidores do Senhor, e pedirmos a oportunidade de uma reencarnação com o
objetivo de cooperarmos com a aplicação da lei divina. Além de ter sido
educativo para aquele que vestiu-se de cego, deu a oportunidade que Jesus
operasse a cura, e nos deixasse mais um valioso ensinamento.
“E
os seus discípulos o interrogaram, dizendo: Por que dizem então os escribas que
é mister que Elias venha primeiro?
E
Jesus, respondendo, disse-lhes: Em verdade Elias virá primeiro, e restaurará todas
as coisas; mas digo que Elias já veio, e não o conheceram, mas fizeram-lhe tudo
o que quiseram. Assim farão eles também padecer o Filho do homem.
Então
entenderam os discípulos que lhes falara de João Batista.” [14]
Nesta passagem fica claro que João Batista
era Elias reencarnado. João era um Espírito de alta envergadura. Vinha com a
missão de ser o revelador do Mestre, aquele que iria fazer a passagem da
revelação de Justiça para a revelação do Amor.
Mas existe também em seu processo
reencarnatório um caráter expiatório.
“Considerando
a severidade com que Elias tratara os adoradores do deus Baal, mandando-os
passar a fio de espada, pela espada padeceu, ao impositivo das paixões de
Herodíades e do terrível medo do reizete Herodes.” [15]
Muitas outras alusões à lei da reencarnação
são feitas nos textos bíblicos, mas cremos que somente estas já se prestam ao
objetivo deste trabalho.
4 -
Mecanismos da Reencarnação
Podemos tratar este tema sob dois aspectos:
científico e filosófico.
O aspecto científico vai requerer um maior
aprofundamento, e um maior conhecimento das ciências biológicas e da física, o
que não é o objetivo deste texto. Portanto, trataremos aqui somente do aspecto
filosófico.
Tomaremos como roteiro o capítulo 13 do livro
“Missionários da Luz” de André Luiz. Não é que todos os processos
reencarnatórios sejam desta forma, mas acreditamos que este capítulo fala de
uma forma geral e bastante completa da programação e da assistência espiritual
realizada, quando este processo está em vias de execução
Para iniciar, André Luiz esclarece que irá
visitar em companhia do instrutor Alexandre, o lar de Adelino e Raquel, onde se
verificaria a reencarnação de Segismundo.
Numa encarnação anterior, Adelino tinha sido
vítima de Segismundo. Este o tinha assassinado, e no momento presente havia
sido programado para ambos uma reencarnação de reajuste em bases de perdão.
Notamos no princípio um momento de angústia
por parte do reencarnante, o que é natural no instante que antecede o processo
reencarnatório. Para melhores esclarecimentos, recomendamos a leitura do
capítulo 47 do livro Nosso Lar, “A volta de Laura”, do mesmo autor espiritual.
Mas o instrutor Alexandre o tranqüiliza: “Tenha coragem. O ensejo próximo é divino para
o seu futuro espiritual. Organizaremos as coisas; não tenha receio.” [16]
A condição espiritual de Adelino, o pai, não
era das melhores. Apesar das promessas no plano espiritual, este não tinha
trabalhado o perdão em sua intimidade, e toda vez que Segismundo aproximava-se
espiritualmente, a aflição era o sentimento que o dominava.
É digno de destaque, a assistência espiritual
recebida pelo casal, quando este sintoniza com as determinações do Alto, dando
assim condição para que se execute o programa traçado na espiritualidade. Além
de Alexandre e André Luiz, existiam vários outros Espíritos a amparar toda a
família neste momento.
Havia ali naquele ambiente, não obstante a
proteção espiritual, uma grande dificuldade de execução do programa, devido aos
conflitos vibratórios causados pela incompreensão das criaturas envolvidas no
processo.
Dessa forma, os Espíritos que realizavam a
proteção do lar de nossos irmãos programaram um momento de contato entre eles
durante o sono físico, a fim de que algumas arestas pudessem ser aparadas.
Não foi fácil; a princípio houve uma grande
aversão entre pai e filho. “É que a
aproximação de Segismundo despertava em Adelino reencarnado as reminiscências
do passado sombrio”, nos esclarece o autor, e continua: “Ele, a vítima de outro
tempo, não conseguia localizar os fatos vividos, mas experimentava, no plano emotivo,
as recordações imprecisas dos acontecimentos, cheias de ansiedades
dolorosas.”[17] Mas como prova de que o amor é mais forte em todos os
cantos do universo, a interseção de Alexandre trabalhando o perdão entre ambos,
promoveu uma paz momentânea entre os dois.
Poderíamos perguntar, por que a necessidade
do pai de aceitar o filho. Não poderia a espiritualidade impor a reencarnação
sem maiores embaraços?
Informa Alexandre que:
“O
pensamento envenenado de Adelino destruía a substância de hereditariedade,
intoxicando a cromatina dentro da própria bolsa seminal. Ele poderia atender
aos apelos da Natureza, entregando-se à união sexual, mas não atingiria os
objetivos sagrados da Criação, porque pelas disposições lamentáveis de sua vida
íntima, estava aniquilando as células criadoras, ao nascerem, e, quando não as
aniquilasse por completo, intoxicava os genes do caráter, dificultando-nos a
ação (…)” [18]
Segismundo iria receber nesta encarnação, um
organismo que o proporcionaria uma moléstia do coração na idade madura, como
conseqüência da falta cometida no passado. Mas isso não seria definitivo,
noticia Herculano, um outro instrutor presente, porque a justiça divina nunca
se manifesta sem a misericórdia, a que sempre se referiu Jesus em seu
apostolado.
Passados os primeiros momentos, em que o
equilíbrio entre os elementos envolvidos no processo era o mais importante, os
mentores do Plano Maior passaram a trabalhar diretamente no processo de ligação
do Espírito às suas necessidades reencarnatórias.
Mas antes de tratarmos com maiores detalhes
sobre a ligação do Espírito com o corpo, lembremos da afirmativa de Alexandre
de que nem todas as criaturas passam por esse instante, de uma forma
consciente:
“(…) A maioria dos que retornam à existência
corporal na esfera do globo é magnetizada pelos benfeitores espirituais, que
lhe organizam novas tarefas redentoras, e quantos recebem semelhante auxílio
são conduzidos ao templo maternal de carne como crianças adormecidas.(…). São
inúmeros os que regressam à Crosta nessas condições, reconduzidos por
autoridades superiores de nossa esfera de ação, em vista das necessidades de
certas almas encarnadas, de certos lares e determinados agrupamentos.”[19]
Era chegado o momento da primeira ligação de
Segismundo à matéria, portanto a assistência Espiritual se fazia altamente
necessária. Como atuaria Alexandre neste processo, agiria no momento da união
sexual? É ele quem, sempre paciente, esclarece:
“Não
é necessária a nossa presença ao ato de união celular. Semelhantes momentos do
tálamo conjugal são sublimes e invioláveis nos lares em bases retas. Você sabe
que a fecundação do óvulo materno somente se verifica algumas horas depois da
união genesíaca. O elemento masculino deve fazer extensa viagem, antes de
atingir o seu objetivo. Temos tempo (…)” [20]
Era chegado o momento a que denominamos
restringimento do corpo espiritual.
“Os
Espíritos Construtores começaram o trabalho de magnetização do corpo
perispirítico, no que eram amplamente secundados pelo esforço do abnegado orientador,
que se mantinha dedicado e firme em todos os campos de serviço.
Sem
que me possa fazer compreendido, de pronto, pelo leitor comum, devo dizer que
‘alguma coisa da forma de Segismundo estava sendo eliminada’. Quase que
imperceptivelmente, à medida que se intensificavam as operações magnéticas,
tornava-se ele mais pálido. Seu olhar parecia penetrar outros domínios.
Tornava-se vago, menos lúcido.
A
certa altura, Alexandre falou-lhe com autoridade:
Segismundo,
ajude-nos! Mantenha clareza de propósitos e pensamento firme!
Tive
a impressão que o reencarnante se esforçava por obedecer.
Agora,
continuou o instrutor, sintonize conosco relativamente à forma pré infantil.
Mentalize sua volta ao refúgio maternal da carne terrestre! Lembre-se da
organização fetal, faça-se pequenino! Imagine sua necessidade de tornar a ser
criança para aprender a ser homem!
Compreendi
que o interessado precisava oferecer o maior coeficiente de cooperação
individual para o êxito amplo. Surpreendido, reconheci que, ao influxo
magnético de Alexandre e dos Construtores Espirituais, a forma perispiritual de
Segismundo tornava-se reduzida.
A
operação não foi curta, nem simples. Identificava o esforço geral para que se
efetuasse a redução necessária.
Segismundo
parecia cada vez menos consciente. Não nos fixava com a mesma lucidez e suas
respostas às nossas perguntas afetuosas não se revelavam completas.
Por
fim, com grande assombro meu, verifiquei que a forma de nosso amigo assemelhava-se
à de uma criança.” [21]
Quando é dito que o corpo espiritual de
Segismundo foi reduzido para o tamanho de uma criança, precisamos analisar esta
palavra num sentido mais amplo.
A que tamanho terá sido restringido o
perispírito de Segismundo? O instrutor pediu ao reencarnante: “Lembre-se da
organização fetal, faça-se pequenino”. Particularmente, entendemos que aqui o
corpo espiritual fica exatamente do tamanho da célula-ovo.
Em seguida, os Espíritos construtores
analisam os mapas cromossômicos e concluem que está tudo bem, à exceção do tubo
arterial na parte a dilatar-se para o mecanismo do coração. Mas nos informam
ainda que se o reencarnante souber valorizar as oportunidades do futuro,
possivelmente conquistará o equilíbrio do aparelho circulatório. É a aplicação
da máxima evangélica: “O amor cobre a multidão de pecados”[22].
Através desta obra, ficamos sabendo também
que o trabalho torna-se mais atuante por parte da espiritualidade até os sete
anos de idade do Espírito reencarnante, época em que o processo
reencarnacionista estará consolidado.
Chegado o momento, era necessário realizar o
ato de ligação inicial, em sentido direto, de Segismundo com a matéria
orgânica.
“Logo
após penetrávamos o aposento conjugal, onde o espetáculo íntimo era divinamente
belo (…)
Os
amigos invisíveis do lar, companheiros de nosso plano, haviam enchido a câmara
de flores de luz (…)
Mais
de cem amigos se reuniam ali, prestando-lhe afetuosa homenagem (…)
O
quadro era lindo e comovedor (…)
Valendo-me
daquele instante (…), perguntei:
Nosso
irmão reencarnante apresentar-se-á, mais tarde, entre os homens, tal qual vivia
entre nós? Já que suas instruções se baseiam na forma perispiritual
preexistente, terá ele a mesma altura, bem como as mesmas expressões que o
caracterizavam em nossa esfera?
Alexandre respondeu sem titubear:
Raciocine
devagar, André! Falamos da forma preexistente, nela significando o modelo de
configuração típica ou, mais propriamente, o uniforme humano. Os contornos e
minúcias anatômicas vão se desenvolver de acordo com os princípios de
equilíbrio e com a lei da hereditariedade (…) Adicione porém, a esse fator
primordial, a influência dos moldes mentais de Raquel, a atuação do próprio
interessado, o concurso dos Espíritos Construtores (…), e poderá fazer uma
idéia do que vem a ser o templo físico que ele possuirá, por algum tempo, como
dádiva da Superior Autoridade de Deus (…)
Segismundo terá então, insisti, uma forma
física eventual, imprecisa, por enquanto, ao nosso conhecimento?
O instrutor esclareceu sem demora:
Se
estivéssemos diretamente ligados ao caso dele, estaríamos de posse de todas
informações referentes ao porvir, nesse particular, mas a nossa colaboração
neste acontecimento é transitória e sem maior significação no tempo. Os
orientadores de Segismundo, porém, nas esferas mais altas, guardam o programa
traçado para o bem do reencarnante. Note que me refiro ao bem e não ao
destino.” [23]
Devido a importância deste esclarecimento,
continuamos com Alexandre:
“Os
contornos anatômicos da forma física, disformes ou perfeitos, longilíneos ou
brevilíneos, belos ou feios, fazem parte dos estatutos educativos (…)
Pormenores anatômicos imperfeitos, circunstâncias adversas, ambientes hostis,
constituem, na maioria das vezes, os melhores lugares de aprendizado e redenção
para aqueles que renascem (…). Em vista disso, o mapa alusivo a Segismundo está
devidamente traçado, levando-se em conta a cooperação fisiológica dos pais, a
paisagem doméstica e o concurso fraterno que lhe será prestado por inúmeros
amigos daqui. (…)” [24]
Finda esta conversa instrutiva, Alexandre
atendendo o pedido dos Espíritos Construtores, realiza uma prece, para depois
entregarem o reencarnante aos braços maternais.
É quando André Luiz nos informa:
“Segismundo
ligara-se a ela como a flor une à haste. Então compreendi que, desde aquele
momento, era alma de sua alma aquele que seria carne de sua carne.”[25]
E dando continuidade, Alexandre disse:
“Agora,
auxiliemos nosso amigo no primeiro contato
com a matéria mais densa. (…)
(…)
Auxiliado pelo concurso magnético do mentor querençoso, passei a observar as
minúcias do fenômeno da fecundação.
Através
dos condutos naturais, corriam os elementos sexuais masculinos, em busca do
óvulo (…). Surpreendido, reconheci que o número deles se contava por milhões e
que seguiam, em massa, para a frente, em impulso instintivo, na sagrada
competição.
(…)
Segundo depreendi, ele (Alexandre) podia ver as disposições cromossômicas de
todos os princípios masculinos em movimento, depois de haver observado,
atentamente, o futuro óvulo materno, presidindo ao trabalho prévio de
determinação do sexo do corpo a organizar-se.
Após
acompanhar, profundamente absorto no serviço, a marcha dos minúsculos
competidores que constituíam a
substância fecundante, identificou o mais apto, fixando nele o seu potencial
magnético, dando-me a idéia de que o ajudava a desembaraçar-se dos companheiros
para que fosse o primeiro a penetrar a pequenina bolsa maternal. O elemento
focalizado por ele ganhou nova energia sobre os demais e avançou rapidamente na
direção do alvo. (…) Sempre sob o influxo luminoso magnético de Alexandre, o
elemento vitorioso prosseguiu a marcha, depois de atravessar a periferia do
óvulo, gastando pouco mais de quatro minutos para alcançar o seu núcleo. Ambas
as forças, masculina e feminina, formavam agora uma só, convertendo-se ao meu
olhar em tenuíssimo foco de luz (…).
Depois de prolongada aplicação magnética, que
era secundada pelo esforço dos Espíritos Construtores, Alexandre aproximou-se
de mim e falou:
Está terminada a operação inicial de ligação.
Que Deus nos proteja.” [26]
Após esta operação, André Luiz diz que estava
boquiaberto com o que vira, e podemos dizer: nós também!
Através destas breves narrativas, quisemos
simplesmente mostrar algo a respeito do mecanismo da reencarnação (que não
termina aqui), e que durante todo o processo reencarnatório há uma linda
programação a ser executada.
É claro que nem todos os casos são tratados
desta forma, mas como sabemos que Deus é Justiça, podemos seguramente dizer que
Ele, através de Seus prepostos, de uma forma ou de outra, preside todos os
movimentos palingenésicos.
__________________________________________________________________
[1] FRANCO, Divaldo P. / Joanna de Ângelis (Espírito).
Estudos Espíritas, 5a ed., Rio de Janeiro, FEB, 1991, cap. 8
[2]
(KARDEC 1980), questão 222
[3] DELANNE, Gabriel. A Reencarnação. 9a ed.,
Rio de Janeiro, FEB, 1994, cap. XI
[4] (KARDEC 1980), questão 132
[5] (KARDEC 1980), questão 167
[6]XAVIER, Francisco C. / Emmanuel. Emmanuel,
15a ed., Rio de Janeiro, FEB, 1991, cap. 5
[7] Isaías, 26:19
[8] João, 3: 1 a 10
[9] DENIS, Léon. Cristianismo e Espiritismo,
10a Ed., Rio de Janeiro, FEB, 1994, cap. IV
[10] Gênesis, 1: 2
[11] XAVIER, Francisco C. / Emmanuel. A
Caminho da Luz, 10a ed., Rio de Janeiro, FEB,1980..
cap. II
[12]
(FRANCO / Joanna de Ângelis [Espírito] 1991), cap. 8
[13] João, 9: 1 a 3
[14] Mateus, 17: 10 a 13
[15]
(FRANCO / Joanna De Ângelis [Espírito]1991), cap. 8
[16] XAVIER Francisco C. / André Luiz
(Espírito). Missionários da Luz. 24a ed., Rio de Janeiro, FEB, 1993, pag. 182
[17]
(XAVIER / André Luiz [Espírito] 1993), pag. 194
[18] Idem, ibidem, pag. 197
[19] Id., ib., pag. 206
[20] (XAVIER / André Luiz [Espírito] 1993),
pag. 207
[21] (XAVIER / André Luiz [Espírito] 1993),
pags. 214 e 215
[22] I Pedro, 4: 8
[23] (XAVIER / André Luiz [Espírito] 1993),
pag. 226
[24] Id., ib., pag. 227
[25] (XAVIER / André Luiz [Espírito] 1993),
pag. 230
[26] Op. Cit., pg. 231 a 233
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